O mais recente sucesso da dupla sertaneja Guilherme e Santiago, "Triste e Alegre", começa de forma objetiva: "Eu fico triste, alegre/Sem beber eu fico triste, bebendo eu fico alegre". Em outro trecho, mais uma vez o consumo de álcool é valorizado: "Há felicidade num copo de bebida..."
Esse é um simples exemplo de como ficar bêbado é visto de forma poética por muitos compositores. E faz tempo. Os veteranos Tonico e Tinoco já cantavam "Pinga ni Mim". "Pra Curar O Meu Despeito/Vou Meter Pinga No Peito/Sufocar Meu Coração/Nesta Casa Tem Goteira/Pinga Ni Mim, Pinga Ni Mim", diz o refrão.
Quem é acostumado a beber diariamente e nunca assume o alcoolismo, com certeza deve achar perda de tempo discutir um tema como esse. Afinal, argumentaria, é apenas uma música... Mas não é só isso. É cultura popular. "Beber até cair" é uma expressão usada tão rotineiramente que o brasileiro não percebe o mal que canções com letras desse tipo podem fazer, principalmente para adolescentes.
Não adianta o poder público se empenhar em fiscalizar estabelecimentos que comercializam bebidas para menores se a mídia faz apologia ao consumo descaradamente e sem restrição. Há comercial em que um grupo enfrenta qualquer coisa e vai até para o inferno, literalmente, por causa de suas latinhas. Em atitudes como essas está a raiz do problema. O jovem acha que precisa beber ou fumar para ser respeitado entre seus amigos. E é levado a pensar assim.
No Brasil, o sertanejo universitário é a moda atualmente. Guilherme e Santiago fazem parte dos novos astros. Mas outra nova dupla, João Carreiro e Capataz, consegue superá-los quando o assunto é venerar o álcool. Em "Conselho de Amigo", eles dizem a Leo e Giba para irem ao boteco esquecer uma paixão. "Vem com nós pro buteco, vem tomá pinga, enxê o caneco", diz um dos trechos. E finalizam com uma orientação ainda mais assustadora e violenta: "Fica sofrendo pro causa dela não/mete o pé na costela dela e mete pinga na guela". Belos conselhos para amigos...
Cantando "Butecologia" com o grupo Rhaas, a mesma dupla desvaloriza a faculdade em nome da cachaça. "Meu pai paga faculdade, tá querendo me formar/Veterinária, agronomia, eu não sei o que estudar/Tanto tempo na facu e o meu melhor resultado/Foi só butecologia que eu fui aprovado".
A bebedeira nunca resolveu nada. Nem na época de Vicente Celestino, autor de "O Ébrio", sucesso de 1936, quando dizia que tomava todas para esquecer uma "ingrata". Usar o abandono de uma mulher para encher a cara é desculpa de alcoólatra. Na vida real, filhos e esposa que apanham dele diariamente não acham um pingo de felicidade no tal copo de bebida.
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